sábado, 19 de novembro de 2022

RECORDAÇÕES III: A ""MATANÇA".

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Era na tarde do último dia da semana. Íamos para a “matança”, lugar cujo nome se confundia com os atos que ali aconteciam, lá no alto da Rua dos Ossos, periferia da cidade de Milagres-CE. Estávamos na faixa dos 8 aos 11 anos de idade. Chegávamos eufóricos, sentávamos no último degrau da cerca do curral, de médio porte, feito de caules de coqueiros. Dentro do curral estavam os garrotes e garrotas que iam morrer. Guardo bem na lembrança a imagem dos irmãos Cosme e Damião, gêmeos, de estatura pequena, bigodinho fino, bem parecidos um com o outro, açougueiros(chamados no lugar de marchantes) e que, embora tivessem nomes de Santos, de santo nada tinham. Os animais eram encurralados, um a um, para uma espécie de “corredor da morte” e, quando chegavam ao seu final, como num pressentimento ruim, tentavam fugir por baixo do último tronco da cerca. Um dos irmãos gêmeos aproximava-se, por fora da cerca, segurava, firmemente, um dos chifres do animal, e o outro chegava, com uma faca-peixeira ligeiramente longa, fina e afiada, e a enfiava na parte interna, entre os chifres do animal e este, num berro alto e triste, caia estrebuchando. Dali era imediatamente arrastado para um lugar descampado, onde o seu coro e as suas vísceras eram retirados. Às vezes, a garrota estava prenha e de dentro dela arrancavam um bezerrinho, já com couro bem macio. Nós, crianças, assistíamos a tudo, como se fosse a coisa mais natural do mundo, e aguardávamos ansiosos pela "bixiga" do animal, que, depois de lavada, era assoprada na boca mesmo, como se bola de assopro fosse, e então se transformava numa grande bola oval de futebol, que usávamos por longo período

 

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