quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Meditações de um Quase Setentão

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior


O famoso poeta português Fernando Pessoa disse que cada dia na vida é um dia a menos.

Não vejo assim. 

Penso que cada dia que passamos mais um dia ganhamos na nossa não tão longa travessia.,  certamente enriquecidos,  negativa ou positivamente, porém com experiências novas, de uma  forma nem sempre linear, porque ora mocinho, ora bandido, às vezes em linha reta, outras em zigue zague, mas sempre com alargamento dos horizontes infindos,  E tudo caminha tão silenciosa e lentamente, tal qual o amarelecer das folhas, como o disse magistralmente o poeta maranhense Ferreira Gullar, em um dos seus famosos poemas, que, quando menos esperamos, passamos, estamos murchos, sem cabelos, trôpegos, no entanto, ainda assm sendo enriquecidos por cada dia que ganhamos. 

Não, nunca perdemos o dia que passamos,  sempre ganhamos.


Recife, 16.12.2020

às 20:02h. 



 

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

O ENCONTRO

Por Francisco Alves dos Santos Júnior 


Naquela tarde

Depois das nuvens escuras

Da chuva forte

Do escoar das águas

Quando tudo serenara

Nos encontramos.

Lábios, bocas, línguas

Num frenesi incontrolável

Numa explosão de excitação

E prazer, 

Naquela tarde,

Quando tudo serenara.

E a noite se aproximava.


Recife, 18.11.2020

quinta-feira, 12 de novembro de 2020

A OPERADORA DA NOVA LIVRARIA

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

À noitinha de 03/11/2020, fui ao Shopping Recife e constatei que no lugar da Livraria Saraiva, que deixou de funcionar há algum tempo, foi aberta outra livraria, com o apropriado nome de "Leitura". Entrei lentamente, senti um forte e agradável cheiro de madeira nova, vindo das suas gigantescas prateleiras,mesclado com o mais agradável ainda cheiro de livros novos, arrumados tanto nas prateleiras, como em enormes balcões espalhados por todos os lados e em gôndolas paralelas ao longo do seu gigantesco espaço. Dei uma olhada geral e dirigi-me a uma vendedora que estava no teclado de um computador. Indaguei-lhe se teria o livro "Nós" e informei-lhe que havia esquecido o nome do Autor. Havia sido indicado pelo colega Frederico Koehler, na sua página do Facebook. A jovem vendedora(que agora é tratada por "operadora") pensou um pouco e com precisão disse-me sorrisinho"Zamiátin. O senhor gosta de distopia, eu adoro" e antes que eu falasse alguma coisa saiu, rapidamente, foi a uma das gigantescas prateleiras, próxima do lado direito da entrada da loja, e trouxe-me o exemplar, já explicando quase tudo sobre o livro e que custava R$ 69,00. Fiquei impressionado e indaguei-lhe se era estudante de Letras, ela disparou a falar que fizera até o segundo ano de engenharia química, mas passara a estudar letras há uns três anos e fora selecionada há pouco para ser operadora "nesta nova livraria". Havia orgulho no seu falar e nos seus olhos, escondidos atrás das lentes dos seu óculos. Não sei por qual motivo, talvez o cheiro dos livros, talvez a sabedoria esperançosa daquela jovem, meus olhos encheram-se de lágrimas, tomei das suas mãos o exemplar do livro, agradeci e fui ao Caixa pagar.

Raimundo Alves, Graciliano Santos e outras 47 pessoas
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terça-feira, 11 de agosto de 2020

Desespero


   Por Francisco Alves dos Santos Júnior        
       
Confusos sonhos atormentam-me.

Nuvens negras, 
Cheias de miséria, fome e dor,
Das quais fugimos aos milhares,
Nos perseguem.

E,
Na fuga desesperada, 
Damos de encontro com uma enorme cerca
De arame farpado,

Depois dela,
Guardas violentos dominam e,
Quando não matam,
Fazem voltar os poucos que, 
Feridos, rasgados, 
Conseguem ultrapassá-la.

E aquelas nuvens negras aproximam-se,
Cheias de miséria, fome e dor.

Os Guardas,
Branquicelos, de rostos macilentos, sem vida, 
Riem sarcasticamente.


Recife, 11.08.2020, umas duas horas depois de ver o filme ADÚ.

sexta-feira, 12 de junho de 2020

MOMENTO


Por Francisco Alves dos Santos Júnior


ABRA A JANELA
DEIXA O SOL ENTRAR,
O VENTO
E O BARULHO DO MAR.
E VEM CÁ
DÁ-ME UM BEIJO.
FAZ-ME UM ACONCHEGO,
COM ESTE TEU SORRISO LINDO,
ESTE TEU JEITO DE OLHAR. 

Recife, 12.06.2020, dia dos namorados, 10h30h.

sexta-feira, 5 de junho de 2020

ANGÚSTIA


      Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Tarde cinzenta, coberta de tênue nevoeiro.
Ventos fortes sopram do oceano atlântico,
Com finos pingos d’água que se chocam com as vidraças das janelas.
Incertezas pairam no ar.
Uma angústia se me atormenta, 
Nestes tempos estranhos
De guerra viral entre as grandes nações.
Mendigos, sem rumo, aguardam esmolas nas calçadas.
Governantes exageram nos gastos públicos
E forram-se com as verbas governamentais.
Tempos estranhos e tão angustiantes como a certeza da morte.


Recife,05.06.2020, num final de tarde chuvoso.

quinta-feira, 4 de junho de 2020

INSONIA.

Faz silêncio, 
Na noite adentro, sinto sua falta mais fortemente.  
E, cansado, 
Vejo o  dia nascer.




INSOMNIA

It is silent,
into the night, I miss you more strongly. And, tired, I watch the day rise.

domingo, 31 de maio de 2020

LEMBRANÇAS

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Hoje, lembrei-me de uma triste cena que presenciei no primeiro ano da faculdade de direito da USP: um dia, quando o Professor Limongi França, titular da cadeira de Direito Civil, chegou com os seus dois Professores Assistentes na sala da nossa classe, o Bedel, que era bem jovem e de cujo nome não recordo, estava sentado na mesa dos Professores, bem na cadeira do tal Professor, terminando de preencher o grande livro de presença dos alunos. Lá da porta de entrada da sala, o Professor Limongi, em alto e bom som. apontando para o Bedel, praticamente gritou:
- quem deu ordem para você sentar-se na minha cadeira? Como diz o ditado popular "cada macaco no seu galho!".
O constrangimento foi geral. Nós todos, alunos novatos, embora atônitos, nos acovardamos e não tivemos coragem de nos rebelar contra aquela grosseira injustiça, e ficamos silentes.
Na época eu ainda não conhecia o poema "Para Aqueles que Virão Depois de Nós" do grande B. Brecht, onde tem um verso que diz mais ou menos o seguinte "a cólera da injustiça faz a voz ficar rouca". Naquele momento, o medo impediu que nossas vozes ficassem roucas diante daquela colérica e bárbara grosseria, ocorrida sob as seculares paredes daquele templo de Justiça e de Liberdade, a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco.

Ainda joje, 45 anos depois, tenho raiva de mim porque, naquele momento, não reagi à altura.
E que Deus se apiede da alma do Professor Limongi França, já falecida, por aquela sua grosseria gratuita e raivosa contra um simples e educado Bedel.

sexta-feira, 24 de abril de 2020

No Vulto da Mulher Amada

                                          Por Francisco Alves dos Santos Jr


Sozinho, como se chega ao mundo,
Vago  no silêncio do vazio de tudo,
E mesclo-me nas faces desconhecidas,
nos sorrisos dos estranhos que passam,
nas serenas águas do atlântico, 
no vulto da mulher amada,
Que partiu numa manhã de sol.

Na madrugada insone,
Raios da lua penetram pelas frechas das janelas,
Com os arrulhos da maré alta,
E dos ventos que a alimentam,
E num sono leve,  quase acordado,
Vejo-me fantasma,
No silêncio do vazio de tudo,
No vulto da mulher amada.

Recife, 22.04.2018, 12:00h.

Olhos Claros

                    Por Francisco Alves dos Santos Jr

Verdes,  Azuis,
Os olhos daquela mulher?
Não importa.
Apenas claros, misteriosos,
Desconcertantemente belos.

Neles divago,
Perco-me,
Volto no tempo,
Remoço-me.

Como faço para neles navegar?
Ou devo simplesmente esquecê-los
Distanciar-me
E sumir no nevoeiro de uma fina neblina matinal?

Recife, não recordo da data.

AS MÃOS


                                                   Por Francisco Alves dos Santos  Júnior

Mãos que quebram o sol na proteção dos olhos,
Puxam a enxada no vigor da juventude,
Dirigem o arado no revolver da terra,
E içam do mar a rede da fartura


Mãos que  acariciam os cabelos,
As faces,
O corpo.
E transformam-se em conchas dos seios da mulher amada
Na preparação dos corpos para momentos inesquecíveis.

As mãos
Que  sustentam o corpo no cajado da velhice
E,
No derradeiro instante,
Jogam, no túmulo, a última pá d’areia
Num lacrimoso triste adeus.


 Recife, 23.07.2015, depois de ler um belo poema sobre o tema mãos do poeta baiano Carlos Roberto Santos Araújo, o Bahia para os amigos.

Guarde

                 Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Se os momentos bons e ruins são efêmeros,

Então guarde a lágrima de amor que te dei.

O sorriso que não dei p'ra ninguém.

Guarde a sensação do corpo quente e trêmulo por você.

Do gozo, dos sussurros e das batidas do meu coração.

Guarde tudo porque eu te dei tudo de melhor que tive, que tinha,

Que tenho.

Recife, 10.10.2013.

Ventos de Julho


               
Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Vidraças tremem e uivam
Com o açoite dos ventos
Vindos do mar

O barulho das ondas
Quebrando na praia
E o uivo dos ventos
Assustam a cadela, que ladra e enrosca-se
Nas pernas da moça
Que reza baixinho
Pedindo aos santos
P’ros ventos cessarem.

A noite aprofunda-se
Os ventos aumentam
As ondas agigantam-se
E, assustadoramente,
Levam as palafitas
Invadem as ruas
Próximas do mar

O medo aumenta
Com a chegada da chuva
Chuva de vento
Que açoita e destrói
Encharca os morros
Que se desmoronam,
Matando e enterrando
Pobres e pobreza
Num quase alívio
De tanta miséria, de tanto sofrer.

Sob uma triste sinfonia
Do surdo dos trovões
Do uivo dos ventos
Do açoite das chuvas
Do clarão dos relâmpagos
Do silêncio das trevas da morte
Debaixo da lama
Debaixo das águas
Num quase alívio
De tanto sofrer.
       
Dedico esse poema a “Seu” Geraldo, pai do compositor-cantor Lenine, poema este que foi feito sob o impacto da notícia da sua morte. O “Seu” Geraldo, com quem tive o prazer de conviver por certo tempo,  era um homem dedicado aos pobres e ao aprimoramento dos seres humanos.
E hoje é um dia de muito vento e muita chuva na cidade do Recife-PE, vindos certamente para levá-lo, com maior rapidez e suavidade, para um mundo melhor.

Este poema  foi pubilicado em um dos números da Revista "Argumento" da AJUFE - Associação dos  Juízes Federais do Brasil.

Recife,  Praia de Boa Viagem, em 16.07.2015

O RETORNO

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

             
Já era noite, quando chegamos,
Depois de muitos dias  de viagem.
Corri ao janelão,
Abri as vidraças
E senti no rosto a tua brisa morna e cheirosa,
O barulho das tuas ondas,
O brilho da luz da lua nas tuas águas,
O farfalhar das folhas dos teus coqueiros,
O som longínquo e triste de um violão apaixonado.
E revi as luminárias da tua Avenida e da tua Pracinha
E as pessoas correndo no teu calçadão.

Quero amanhã sentir o calor do teu sol,
O acariciar das tuas areias nos meus pés,
A mornidão das tuas águas
E ouvir o grito do vendedor de picolés, de salada de frutas, 

Ah como quero!

Minha linda Praia de Boa Viagem.
  


Recife, 06.01.2018, 23,03 horas.

terça-feira, 21 de abril de 2020

Indiferença


Olho
E não vejo
Passo hirto.
Ele, ela, eles, humanos.
Alguns dormem(anestesiados pelo crak?)
sob as marquises.
Outros estendem as mãos e murmuram algo.
Não são ouvidos.
Já fazem parte da paisagem urbana brasileira.
Será por isso que não são mais notados?
Olho, passo e não vejo.
E você?

Recife, 12.03.2020, após um passeio pelas Ruas do Recife.